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Política

Plano de Bolsonaro para zerar ICMS sobre diesel e GLP enfrenta riscos jurídicos, dizem advogados

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Plano de Bolsonaro para zerar ICMS sobre diesel e GLP enfrenta riscos jurídicos, dizem advogados

SÃO PAULO – A proposta vocalizada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), na última segunda-feira (6), de compensar parcialmente as perdas de arrecadação dos estados que aceitarem zerar as alíquotas de ICMS sobre o diesel e o gás de cozinha (GLP) pode enfrentar, além de batalha política contra governadores, disputas na Justiça.

Especialistas do Direito ouvidos pelo InfoMoney acreditam que, levando em conta as diretrizes apresentadas pelo governo federal, o plano tem chances razoáveis de judicialização, mas é preciso aguardar a apresentação em detalhes.

A expectativa é que uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o assunto seja apresentada pelo senador Eduardo Gomes (PL-TO), líder do governo no Congresso Nacional, nesta quarta-feira (8).

Desta forma, apesar de o texto ser gestado no Palácio do Planalto, seria possível evitar impressões digitais do presidente Jair Bolsonaro ‒ o que ajudaria a reduzir eventuais riscos jurídicos do movimento para a campanha à reeleição do mandatário.

Por se tratar de PEC, a proposição tem tramitação mais complexa no parlamento, sendo necessária aprovação em dois turnos de votação, com quórum de 3/5, em cada casa legislativa. Superadas essas etapas, o texto vai a promulgação pelo Congresso Nacional, não sendo submetido a sanção presidencial.

O plano do governo é forçar a aprovação de um projeto de lei complementar (PLP 18) em tramitação no Senado Federal que estabelece um teto de 17% para o ICMS dos combustíveis, energia elétrica e comunicações ao colocar os itens no rol de bens e serviços essenciais e indispensáveis tratados pela legislação.

Governadores cobram compensação às perdas com o estabelecimento da alíquota limite, mas Bolsonaro ofereceu, com a PEC, o ressarcimento temporário (até 31 de dezembro de 2022) somente aos estados que aceitarem zerar o tributo cobrado sobre o diesel e o gás de cozinha ‒ e apenas das perdas geradas a partir da taxa de 17% prevista no PLP em discussão. Ou seja, parte do prejuízo teria que ser arcado pelos próprios entes.

Para o advogado Carlos Navarro, professor da pós-graduação em Direito Tributário da FGV-SP e sócio de Galvão Villani, Navarro, Zangiácomo e Bardella Advogados, os movimentos do governo inspiram “grande preocupação” pelos riscos de avançarem sobre a seara do pacto federativo e afetarem de forma sensível a autonomia orçamentária dos estados.

“É claro que uma PEC pode muito mais que uma lei complementar. Mas mesmo a PEC deve respeitar as cláusulas pétreas, dentre as quais se insere o pacto federativo. Parece que qualquer que seja o caminho, isso tende a gerar judicialização”, avaliou.

“Se o governo decidir pelo caminho do diálogo e os estados estiverem convencidos disso, talvez, independentemente da constitucionalidade, ninguém vá ao Judiciário. Mas em havendo ao menos um estado que esteja desconfortável, a chance é grande de judicialização. A influência de um ente sobre o outro para reduzir o tributo deste é sempre algo muito delicado. Os estados trabalham com seus orçamentos e eles que devem decidir sobre isso. Qualquer tipo de interferência de um ente na esfera orçamentária de outro sempre vai ser uma ameaça ao próprio pacto federativo”, disse.

Na avaliação do especialista, ainda que seja possível construir um acordo que satisfaça os governadores e evite uma disputa na Justiça hoje, nada impede que futuramente a questão seja judicializada em outro contexto político e econômico ‒ mesmo que a PEC ofereça compensação integral para as perdas a partir dos 17% previstos no PLP 18.

“Uma coisa é haver compensação financeira, a União repassar parte de sua arrecadação aos estados. Neste movimento, os estados têm pouco controle daqui para frente. Quando estamos falando de arrecadação própria, em que existe um abismo de distância do nível de autonomia em comparação com um repasse. Isso por si só é uma grande ofensa ao pacto federativo e pode já gerar discussões”, explicou.

O advogado não descarta o risco de uma repetição das disputas que envolveram a Lei Kandir, que estabelecia compensação financeira aos estados em razão da desoneração das exportações. E com um agravante: no caso atual, o especialista vê ainda menor convergência em relação às premissas do plano em discussão.

Ainda que veja desafios jurídicos significativos para o avanço da PEC anunciada por Bolsonaro, Navarro entende que há problemas ainda maiores envolvendo a aprovação do PLP 18.

“É muito mais problemático ‒ também do ponto de vista da forma, porque não cabe a lei complementar estabelecer limites de alíquotas. Segundo a Constituição, as alíquotas são determinadas pelo estado, por meio de lei, ou por resolução do Senado em caso de operações interestaduais. Não consigo enxergar possibilidade de lei complementar tratar desta matéria. A meu ver, é uma inconstitucionalidade ainda mais evidente”, pontuou.

A tributarista Jéssica Garcia Batista, sócia de Peluso, Stupp e Guaritá Advogados, também chama atenção para a forma de tratar da questão. “Acredito que possa haver discussões pelo meio legislativo que está sendo empregado para fazer essa limitação, porque a Constituição confere aos estados o poder de fixação das suas alíquotas internas”, observou.

Do lado do conteúdo, no entanto, a advogada acredita que o espaço para contestações ao PLP no Judiciário é reduzido. Ela lembra que o Supremo Tribunal Federal decidiu, em novembro de 2021, sobre a essencialidade de determinados bens e serviços e entendeu que a cobrança de alíquota superior a 17% de ICMS sobre operações de fornecimento de energia elétrica e serviços de telecomunicação é inconstitucional. Na ocasião, foi feita uma modulação sobre os efeitos da decisão, estipulando que os efeitos passem a valer a partir do exercício financeiro de 2024.

Para Batista, a PEC pode ensejar mais discussões jurídicas por envolver a definição de compensações para as perdas de arrecadação esperadas pelos estados. “Quando falamos de redução de tributação e compensação pela União para os estados, ficamos receosos dos termos e se isso efetivamente vai acontecer”, afirmou.

“No caso da Lei Kandir, os estados brigaram por muito tempo com a União para ter a compensação da perda de arrecadação. Nesse caso [da PEC], acredito que o principal vai ser como vai se dar essa compensação. Como vai ser o cálculo? Porque o governo limitou o valor de R$ 25 a 50 bilhões. Se há uma limitação orçamentária, alguém vai ficar sem receber? O ponto principal está nessa perda de arrecadação. Dependendo de como a PEC vier desenhada, pode trazer muitas discussões”, concluiu.

Risco eleitoral?

O caráter eleitoral do movimento de Bolsonaro, que busca conter a alta nos preços para crescer nas pesquisas, foi alvo de críticas de adversários políticos. Alguns, inclusive, falam na possibilidade de as ações implicarem em abuso de poder político e econômico ‒ o que em tese poderia ameaçar a candidatura à reeleição do mandatário.

Especialistas consultados por esta reportagem, contudo, acham difícil que eventuais questionamentos desta natureza prosperem na Justiça Eleitoral.

“Inspirar [ações] pode, mas acho difícil configurar, porque é ampla, envolve Congresso e estados”, observou o constitucionalista Guilherme Amorim Campos da Silva, Sócio de Rubens Naves Santos Jr. Advogados.

“Não vejo essa possibilidade. Primeiro, por se tratar de uma PEC, aprovada pelo Congresso Nacional. O poder político nesse caso não ficaria restrito ao presidente. Segundo, por ser uma reorganização tributária, envolvendo diversos entes federativos, o que não se adequa a restrição quanto à concessão de benefícios sociais. Pode até se tornar objeto de questionamento, faz parte do jogo, mas não vejo chance de prosperar”, avaliou o advogado eleitoral Cristiano Vilela, sócio do escritório Vilela, Miranda e Aguiar Fernandes Advogados e membro da CAOESTE/Transparencia Electoral (Confederación Americana de los Organismos Electorales Subnacionales).

Fonte da notícia

Redação

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